A ciência da hipnose – O que acontece com o cérebro ?



A prática da hipnose é antiga, ainda que os registros sejam escassos. Menos raro é a discussão quanto a validade da hipnose como terapia e sua veracidade como prática e não apenas charlatanismo e entretenimento.

O entendimento a respeito da atividade do cérebro durante o transe é bastante recente. Assim como outras modalidades terapêuticas tem sido testadas conforme a tecnologia que torna isso possível avança, a hipnose foi colocada à prova algumas vezes .

Podemos dizer que conforme a ciência moderna e tecnológica avança as ciências antigas das escolas de mistérios vão sendo confirmadas de novo e de novo .

Em 1997, o psiquiatra americano Henry Szechtman conduziu uma experiência com 8 voluntários. Eles foram vendados e ouviram uma gravação que dizia : “O homem não fala muito. Mas, quando ele fala, vale a pena ouvir o que diz”. Szechtman desligou o som e pediu ao grupo que tentassem imaginar a frase. Em seguida, hipnotizou todos e disse que iria tocar a fita novamente. Era mentira; não havia som nenhum. Mesmo assim, os voluntários disseram ter ouvido a gravação – eles sofreram uma alucinação auditiva por causa da hipnose.

Monitorando o cérebro dos voluntários, notou-se que durante a alucinação hipnótica e quando a gravação estava realmente tocando, a atividade do cérebro era idêntica. Já quando apenas imaginavam o som, a atividade era diferente. O estudo comprova que a hipnose existe, não é fingimento e tem um efeito sobre o cérebro que acredita que a sugestão é real . Uma pessoa hipnotizada pode ver, ouvir e sentir o que é sugerido pelo hipnotizador.

Em 1990, um estudo da prestigiosa revista Science, liderado por Pierre Rainville, da Universidade de Montreal, levou pessoas hipnotizadas a colocarem sua mão esquerda na água com a temperatura aquecida até 116 graus Fahrenheit ou 46 graus Celsius. Como estavam hipnotizadas, não sentiam dor. Rainville observou o cérebro dos mesmos e descobriu que o sistema límbico, um pedaço primitivo do cérebro que herdamos dos répteis e processa os sinais que vêm do corpo, como a dor, estava operando normalmente. Mas o neocórtex, região cerebral que só existe nos mamíferos avançados e é responsável pela nossa consciência, ignorava os sinais do sistema límbico. É como se, durante a hipnose, o “cérebro humano” parasse de se comunicar com o “cérebro reptiliano”.

É por isso que a hipnose tem efeitos tão profundos. Como o neocórtex é privado das informações fornecidas pelo sistema límbico (que além de processar a dor também controla a memória e reações como desconfiança, vergonha, medo, fome, iniciativa, prazer e desejo sexual), a consciência fica sem reservas ou referências boas ou más, portanto , totalmente vulnerável às sugestões do hipnotizador.

Em 2016, um estudo foi realizado e publicado por um grupo de pesquisadores liderados por David Spiegel, especialista em ciência da hipnose da universidade de Stanford (EUA) . Utilizando escalas de suscetibilidade foram selecionados sujeitos saudáveis que foram classificados como “muito” ou “pouco” suscetíveis à hipnose para passarem por indução hipnótica .

Os autores do estudo usaram máquinas de ressonância magnética para observar os cérebros de 57 pessoas durante hipnose, sendo 36 altamente suscetíveis e 21 pouco como controle.

A atividade do cérebro durante a hipnose também foi comparada com a atividade durante períodos de repouso e durante uma tarefa de memória, tanto para grupos de alta e baixa susceptibilidade.

Spiegel e seus colegas identificaram um punhado de diferenças entre o cérebro hipnotizado e um que é totalmente consciente.

As varreduras revelaram diferenças em partes do cérebro relacionadas à atenção, controle de impulsos e consciência do corpo e do ambiente . Os cérebros dos voluntários propensos a hipnose, também apresentaram menos conexões entre uma região profunda do cérebro que é ativada na auto-reflexão e ao sonhar acordado e áreas do córtex pré-frontal envolvidas no planejamento e execução de tarefas.

"É por isso que o hipnotizador no palco pode fazer um treinador de futebol dançar como uma bailarina sem se sentir consciente sobre o que ele está fazendo", disse Spiegel ao New York Times e porque a hipnose pode ser uma parte útil da terapia: torna as pessoas maleáveis ​​e abertas o suficiente para fazer e acreditar em coisas que de outra forma não considerariam. Ver um problema com novos olhos "Tem todo o tipo de capacidade que as pessoas estão apenas descobrindo como usar" - uma característica que torna essa, uma ferramenta médica valiosa tanto quanto um belo truque.
"Eu vejo a hipnose como um tipo de aplicativo que você não usou em seu celular. Tem todo o tipo de capacidade que as pessoas estão apenas descobrindo como usar, mas se você não o usa, o telefone não faz isso". – Spiegel

O Conselho Federal de Medicina já reconhece a hipnose como ferramenta no tratamento de dores crônicas (o Hospital das Clínicas, em São Paulo, oferece a hipnoterapia como opção para tratar as dores de pacientes de câncer) e em várias formas de psicoterapia – há estudos comprovando que ela é eficaz contra o tabagismo, a ansiedade, a depressão e outros transtornos psíquicos.

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