As Três Espécies de Consciência: Grupal, Pessoal e Universal

 



Os três níveis de consciência se encontram em cada uma das três espécies de consciência: na consciência pessoal, na consciência coletiva ou grupais e na consciência universal. Não sabemos exatamente como se constituíram essas três espécies de consciência na evolução humana. Pode-se presumir que a consciência se formou inicialmente no grupo como uma espécie de órgão de orientação coletiva, atuando instintivamente. A seguir, a partir das relações pessoais entre os indivíduos no grupo, ela se diferenciou em termos de eu, tu, nós e vós e se tornou consciente. Finalmente, através das imigrações de grupos, de seus encontros e miscigenações, ampliou-se até uma consciência universal, no sentido de uma experiência religiosa de uma única Terra e do universo inteiro.

A consciência grupal não olha para o indivíduo como uma pessoa, mas para o grupo como um todo e vê o indivíduo apenas em sua função para o grupo. Ela atua como um movimento comum de todos e assemelha- se à imagem da direção de um cardume de peixes ou de um bando de aves. Seu objetivo é a conservação e a sobrevivência do grupo. O indivíduo olha para as exigências do grupo, mas o grupo não leva em consideração o indivíduo. A consciência grupal, que atua de modo arcaico, hoje geralmente não é mais percebida por nós. É como se ela tivesse descido às áreas mais íntimas de nossa existência ou permanecesse no âmbito de fenômenos de campo biológicos e transpessoais, que agem por nós como funções superiores, importantes para a sobrevivência, sem que estejamos sempre conscientes de sua atuação. Muitos fenômenos anímicos que se manifestam nas constelações relacionam-se com os processos dessa consciência coletiva, que pode ser de um grupo, uma horda, um clã, uma estirpe ou uma família. Como geralmente não sentimos essa consciência, só podemos percebê-la em seus efeitos sobre os grupos. Na medida em que podemos percebê-la, isso nos dá a possibilidade de assumir conscientemente a condução, conseguindo boas soluções que satisfaçam a consciência grupal e simultaneamente ajudem a superar suas limitações.

Com a crescente diferenciação dos grupos em diversas tarefas, habilidades e relações internas, a importância atribuída ao indivíduo pelo seu desempenho, o desenvolvimento do que chamamos “pessoa”, com a simpatia e o amor pessoal, a consciência evoluiu, passando de um órgão geral de orientação a uma instância individual que “fala” ao indivíduo. Essa consciência é geralmente sentida por nós como uma força que nos dirige, através de sentimentos de prazer e desprazer. O indivíduo é valorizado como pessoa, as relações individuais dentro do grupo tomam-se mais importantes e as diversas necessidades emergentes dos indivíduos e dos subgrupos precisam ser harmonizadas com as demandas do grupo inteiro. É necessária uma moral que vincule os indivíduos ao grupo, preservando e mantendo em ordem o tecido das relações, agora diferenciadas.

O “bom” e o “mau” tornam-se então um marco de distinção para o correto comportamento no grupo, e também um laço que une o grupo delimitando-o em face de outros grupos. É bom o que serve ao próprio grupo, e é mau o que serve a grupos que competem pelo mesmo lugar e pelos mesmos recursos. É bom o que coloca o indivíduo a serviço de seu grupo ou subgrupo e o conserva vivo. É mau o ato do indivíduo que ameaça as normas vigentes, em prejuízo do grupo, de seus membros e do próprio indivíduo. Dessa maneira, com “boa consciência” e visando à preservação e à moral de nosso grupo, frequentemente causamos graves danos a outros grupos e a seus membros ou a outros membros de nosso próprio grupo.

Essa consciência humaniza os relacionamentos através da simpatia, mas apenas dentro do próprio grupo e, mesmo aí, muitas vezes, somente entre determinados indivíduos do grupo. Comparada à consciência coletiva, a consciência pessoal é um “progresso”, porque diferencia os indivíduos como pessoas e permite o amor pessoal. Ao mesmo tempo, porém, ela cria a possibilidade de grandes conflitos entre as relações pessoais, os interesses do grupo e as ordens arcaicas em ação.

A consciência universal que se refere ao “Um” é necessária quando grupos diferentes entram em intercâmbio e se congregam em unidades maiores, como as nações, que por sua vez entram em contato recíproco, até que finalmente sentimos que todos nós fazemos parte de uma só terra e temos uma origem cósmica. Essa consciência se volta para o indivíduo como um “ser humano”, que leva em si o que é comum a todos os homens e também para o “grande Todo”, em que nos inserimos como suas “partes”. O valor da pessoa, a simpatia e o saber compartilhado expandem-se igualmente sobre toda a terra. Os indivíduos transpõem limites e constroem pontes ao criarem novas relações pessoais, familiares, intergrupais, nacionais, linguísticas e culturais. A consciência se orienta pela participação num éthos compartilhado. Talvez seja essa consciência que o apóstolo Paulo tinha em mente quando falou da lei inscrita em todos os homens. Quando Bert Hellinger fala dos “movimentos da alma”, ele não designa o procedimento metódico que permite o livre movimento dos representantes, mas o próprio movimento dos representantes na busca de soluções, ultrapassando os limites dos indivíduos, dos casais, dos pequenos e grandes grupos. Nisso ele tem em vista essa espécie de consciência que sentimos como algo totalmente leve e sem paixão, como algo universalmente “válido” que atua sobre o particular. A consciência grupal e a consciência pessoal atuam, nos movimentos da alma, em relação ao que abrange todos os seres humanos, enquanto “acolhidos” (no sentido de “liberados”, “preservados” e “elevados”).

Cada uma das três espécies de consciência conserva, entretanto, sua própria necessidade para a nossa vida de relações. Elas atuam, dirigem e fluem juntas e se completam, mas também se contradizem. Mesmo no nível individual da consciência aparecem contradições, por exemplo, entre as exigências do pertencer e as imposições da segurança. No trabalho terapêutico é preciso saber que espécie de conflito de consciência está, conscientemente ou não, por trás de um problema, que vínculos, eventos e comportamentos dos indivíduos e dos grupos estão atuando e que espécie de consciência e, em que nível, oferece caminhos para a solução. Uma criança que vive separada de seu pai e percebe que a mãe foi ferida pelo pai e tem um baixo conceito dele, tem diante da mãe uma boa consciência, na medida em que renuncia ao máximo ao contato com o pai. O preço disso é que ela tem má consciência em relação ao pai. Quando ela prefere ficar com o pai, tem boa consciência diante dele e má consciência diante de sua mãe. A consciência pessoal, por si só, não ajuda a progredir, nesse caso, e deve ser completada pela percepção dos efeitos da consciência grupal, que leva em conta o pertencer e a união de todos no grupo, independentemente do que os indivíduos pensem uns dos outros.

O direito, que assiste a uma criança falsamente apresentada como legítima, de saber quem é o seu verdadeiro pai e ter contato com ele e com sua família é eventualmente obstado pelo tabu familiar ou pela boa intenção da mãe de não prejudicar as relações na família. A necessidade sentida por uma mãe, durante uma fuga, de deixar insepulta uma criança para colocar as demais e a si mesma em segurança, entra em conflito com o seu impulso de manter todos unidos, inclusive os mortos, enterrando-os dignamente junto dos antepassados e também com o amor pessoal da mãe por esse filho. A necessidade de submeter-se às normas vigentes no lugar de trabalho ou no espaço político pode entrar em conflito com os impulsos morais da família.

A solução geralmente consiste em ultrapassar uma consciência excessivamente estrita, na direção de um contexto e de um quadro relacional de maior amplitude. Às vezes, porém, a solução também exige que uma consciência excessivamente ampla reduza essa amplitude para colocar em ordem vínculos estreitos e próximos. As constelações abrem possibilidades para trazer à luz os variados conflitos de consciência e tomá-los passíveis de solução. A partir do profundo saber que todos nós compartilhamos como seres humanos, os representantes nas constelações, quando têm liberdade de movimento e tempo suficiente para superar os estreitos vínculos do sistema representado, frequentemente encontram soluções abrangentes. O terapeuta, conhecendo os processos de vinculação e os processos psíquicos e mentais de liberação, também pode ajudar, com discretas intervenções, os representantes e o cliente a encontrarem a solução adequada para o caso.

Jakob Robert Schneider

– trecho do livro – A Prática das Constelações Familiares


Lembre-se não existe verdade absoluta, nem técnica com 100% de efetividade, essa é portanto uma abordagem, uma ferramenta que pode ou não ser aquela que te vai te ser útil. Ou ainda a depender da área que você aplique, as vezes funciona maravilhosamente em uma e não da frutos na outra, e assim você continua aprendendo novas ferramentas e explorando novas percepções. Isso é vida! Ferramenta inútil mesmo é aquela que você não usa.

Eu te desejo paz sobre todas as coisas.

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